Assinalado todos os anos a 6 de maio, o Dia Mundial da Asma é um momento crucial para trazer à tona uma realidade que afecta silenciosamente mais de 750 mil portugueses. Por detrás dos números, estão histórias de vidas condicionadas por uma doença que, sendo crónica e inflamatória, compromete profundamente o bem-estar e a rotina de milhares de famílias de norte a sul do país. Em locais como Braga, Beja, Portimão ou a própria capital, os serviços de saúde sentem o impacto diário de uma patologia que ainda está longe de estar sob controlo.
Segundo a Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP), cerca de 68% dos doentes diagnosticados com asma em Portugal vivem com a doença mal controlada. Isto significa que mais de meio milhão de pessoas vivem com sintomas frequentes como falta de ar, chiadeira no peito, tosse seca e sensação de aperto torácico. Situações essas que não só limitam fisicamente, como têm consequências emocionais, sociais e até laborais.
Maria do Rosário, de 43 anos, moradora em Viseu e mãe de duas crianças, relata que passou anos a viver "a pensar que era só cansaço ou stress". Só depois de uma crise grave numa noite de inverno, foi diagnosticada com asma persistente. "Acordei a meio da noite a sufocar. O meu marido levou-me ao hospital e foi aí que me explicaram tudo. Desde então, a minha vida mudou por completo."
O diagnóstico precoce é vital, mas a verdade é que muitos portugueses continuam a desconhecer os sinais da doença. De acordo com o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), estima-se que uma fatia significativa da população asmática só recebe diagnóstico depois dos 30 anos, quando os sintomas já se agravaram.
A espirometria, um exame simples e não invasivo, é uma das principais ferramentas de diagnóstico. Contudo, a sua utilização ainda não é rotina em muitas unidades de cuidados primários. A SPP defende, aliás, a inclusão sistemática deste exame nos rastreios anuais realizados em centros de saúde, sobretudo nas populações de risco.
A adesão irregular ao tratamento continua a ser um dos maiores entraves ao controlo da asma. Muitos pacientes, segundo a Associação Nacional dos Doentes Respiratórios (ANDAR), utilizam os inaladores apenas durante as crises agudas, descurando completamente a medicação de manutenção.
O problema agrava-se com a má utilização dos dispositivos inalatórios. Segundo um estudo recente conduzido pelo Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte, mais de 40% dos doentes asmáticos cometem erros críticos na administração da sua medicação, reduzindo a eficácia do tratamento.
É por isso que campanhas como o "Autocarro da Asma", promovido pela SPP e com apoio das ARS (Administrações Regionais de Saúde), percorrem o país para sensibilizar comunidades inteiras. Em 2024, o projecto passou por cidades como Coimbra, Évora e Funchal, oferecendo rastreios gratuitos, sessões informativas e formação prática sobre o uso correto dos inaladores.
Nos casos mais graves, a medicina tem vindo a oferecer novas soluções. As terapêuticas biológicas, como os anticorpos monoclonais administrados em ambiente hospitalar, têm-se revelado eficazes no controlo da asma grave. O Hospital de Santa Maria, em Lisboa, é uma das unidades de referência neste tipo de abordagem, acompanhando actualmente mais de 500 doentes em programas personalizados.
Mas o controlo da asma não passa apenas pela medicação. Os especialistas são unânimes ao afirmar que a cessação tabágica, a prática de actividade física adaptada, a melhoria das condições habitacionais e a vacinação contra a gripe e pneumonia são componentes essenciais.
O Dia Mundial da Asma não é apenas uma efeméride médica. É um lembrete público de que viver com asma não tem de ser sinónimo de limitação. Com diagnóstico atempado, seguimento regular e informação acessível, é possível garantir que milhares de portugueses tenham uma vida activa, segura e livre de crises.
Como afirmou recentemente o Dr. Filipe Froes, pneumologista e coordenador da Comissão de Infecciologia Respiratória da SPP, "a asma não é apenas uma doença, é um desafio nacional de saúde pública que exige compromisso, investimento e educação".